domingo, 19 de agosto de 2012

Sertanejo Universitário e Beethoven. Um encontro no tempo e no espaço.

Duelo de gigantes. Bem, talvez Beethoven não considerasse o concorrente como tal.

Alguns fatos históricos produziram "movimentos musicais" muito interessantes e importantes do ponto de vista socioetnomusicológico (conheciam essa?). O mais importante de que tenho notícia é aquele que decorreu da Revolução Francesa: a figura do burguês surge como o principal ator do cenário antes dominado pelo aristocrata; com o primeiro vem a enorme vontade de consumir os bens que antes só eram acessíveis ao último. Eis a situação perfeita para o artista se promover.
Explicando: durante muito tempo, ser músico era considerado uma ocupação como qualquer outra - um escrivão, um lojista ou um enfermeiro, por exemplo. O fascínio pelo músico-artista que se instaura com toda força no Romantismo é fruto em muito da compreensão de compositores - como Beethoven - a respeito do novo mercado que se abria para os que trabalhavam com Música.
Antes que me venham com acusações a respeito da qualidade de Beethoven, é importante mencionar que não há dúvida de que se trata do melhor músico de sua época, um dos maiores gênios produzidos pela Humanidade. A questão é que nesse caso juntou-se a fome com a vontade de comer: o cara foi um gênio da  autopromoção, sabia se valorizar como ninguém e isso sem ser empregado de corte nenhuma. Morreu rico e exercendo - até hoje - profundo fascínio em gerações e gerações.

"O Segredo de Beethoven" ("Copying Beethoven")

A cena acima de "O segredo de Beethoven" é uma das mais interessantes do filme. O descreve como um sujeito grosso, fanfarrão e exótico. Terror dos vizinhos. Melhor ainda é quando, ao fim, uma senhora idosa, sua vizinha sempre muito maltratada pelo Grande Ludwig, responde a Anna Holtz sobre o porquê dela não se mudar dali: "Você está brincando... eu moro ao lado do grande Beethoven! Eu tenho o privilégio de ouví-lo compondo e tocando suas novas obras antes de qualquer outra pessoa..."
Se dissessem para este "simples músico" que, duzentos anos depois, além de muitas honras em seu nome, sociedades dedicadas a estudar sua obra, bustos, pinturas... até uma máscara mortuária sua poderia ser vista incrustada em um bloco de granito na ilha de Paquetá, escondida na cidade do Rio de Janeiro, num país da América do Sul, imagina o que ele diria: "É claro que existe!"


Máscara de Beethoven em Paquetá-RJ

Situação curiosamente semelhante ocorre hoje em dia: grande parcela da população acostumada a uma atuação periférica, marginal da sociedade de consumo passou  a fazer parte do jogo: possuem um trocado para comprar TVs, aparelhos de DVD, home theaters (como eu odeio usar termos em inglês!). Não poderia ser diferente com Música e Cinema. De olho nessa rapaziada, a indústria cultural leva ao topo das paradas de sucesso (mal posso esperar para ouvir e ler meus colegas musicólogos querendo brigar comigo) "ai seu te pego, vou querer tchu, tcha e tchetcherere na Avenida Brasil com padres e pastores ".
Um estudo interessante a respeito do assunto pode ser visto em "Violência e Democracia", da Angelina Peralva; com um argumento que passa por algo como "a ditadura mantinha o pobre afastado do jogo; com o fim dela, ele passa a frequentar os espaços comuns às classes médias, gerando um choque" - vale a leitura.
Agora, estilos que eram puramente regionais - beirando o folclórico aos olhos do sujeito das metróples  - se tornaram "universitários". Primeiro foi o forró, agora tem sertanejo, brega e sei mais lá o que a mão invisível de Adam Smith promoverá ao nível superior. Adoraria ver o contrário: dodecafonismo do ensino médio; atonalismo infantil...
Atualize-se ouvindo as músicas do vídeo abaixo. Não deixe de se atualizar de novo na semana seguinte e assim por diante até não sei quando.

Top 10 Sertanejo Universitário 2012


E vou fechar citando o grande professor Eduardo Lakschevitz que, em suas aulas de História da Música Romântica provocava: "Se Beethoven, com aquela qualidade toda, se esmerava em vender sua obra pelo melhor preço e se autopromover, o que devemos nós em nossos humildes patamares fazer?"
E um pouquinho de grande Romântico Ludwig Van pra contrabalançar. ok? Uma bem pop, Romantismo Universitário.

"Sonata para piano no. 8 - Patética"

terça-feira, 31 de julho de 2012

Ídolos da Música: Rock? Pop? Samba? Que nada! "Algodão-doce pra vocês!"


A idolatria é algo intrigante.
Cada qual por seu viés, religiosos, psicanalistas, bêbados, artistas e outros espécimes na fauna humana tentam decifrar algo desse impulso. Muitas vezes histérico, outras vezes obstinado, instantâneo, breve, por toda a vida... enfim: pra todo gosto - aliás, comercializa-se.
Me lembro - e compartilho abaixo - da atitude de algumas pessoas quando começa a rolar "Tom Sawyer" no show do Rush no Maracanã (observe entre 0:31 e 0:37). Vai além de apreço.


A idolatria é algo impressionante.
Nunca idolatrei coisa alguma, seja gente, deus ou artista. Gosto de tudo isso, mas nunca fui tão fundo como aqueles que pesquisam o tamanho do pênis do Bruce Lee, ou que ouvem música religiosa fora do momento e do ambiente dos seus cultos (muitas vezes querem obrigar você a ouvir também) e por aí vai... assim, embora muitas vezes esteja em contato com artistas e outros profissionais que admire muito, não me lembro de ter me sentido no direito de perseguir ou aporrinhar alguém por admirá-los - na verdade acho isso o fim da picada, e olha que tenho uma admiração absurda por alguns seres humanos!
Jimi Hendrix levando a relação com o instrumento a outro patamar; Tom Jobim grandioso com nosso jeito tranquilo e elegante; John Lennon imperturbável, convicto, genial; João Bosco com aquelas levadas absurdas de violão; Chico Buarque e muitos outros que nunca igualarei.
Me lembro quando iniciei o projeto da Casa de Música de Ipanema, ainda com poucos alunos e muito tempo não-contado. Numa bela tarde me liga um tal de Daniel querendo ver se resolvia um problema com seus arquivos midi. "Daqui a meia hora apareço aí". Tempo passado, toca a campainha, fui atender e lá estava: Daniel Azulay em carne e osso.
Para os que não conhecem, foi o sujeito que representava na minha infância o que a Xuxa representou para os "baixinhos" no fim da década de 80/ início da de 90; tinha seu próprio programa de televisão para o público infantil; além disso ele cantava, tocava e compunha coisas muito interessantes e ainda foi - é - um dos maiores desenhistas do Brasil, com exposições e trabalhos premiados no mundo inteiro. Atualmente seu trabalho de educação artística é disseminado através das "Oficinas de Desenho Daniel Azulay" por todo o Rio de Janeiro.
Pois bem, o cara chegou, ouviu os arquivos dele - não tinham conserto -, bateu um grande papo comigo sobre arte, tomou o café que eu fiz! Desculpe... ele é meu ídolo.
Abaixo, "Nó em pingo d'água". Faixa de abertura de "Turma do Lambe-lambe", primeira fita-cassete que ganhei na vida. Minha mãe chegou em casa dizendo que o próprio Daniel tinha mandado pra mim.


A idolatria é algo um tanto saudoso.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Mais podres do que nunca!


Após quase trinta anos estudando Música formalmente, posso dizer que sou músico. Para o bem e para o mal. Garanto é que nunca fico indiferente ao fenômeno musical - nem tentando com todas as minhas forças.
Muito da minha relação com a Música devo ao meu irmão que, antes de mim, colecionava discos e os ouvia alto no quarto. AC/DC, Iron Maiden e Deep Purple, Pink Floyd sempre foram coisas normais para mim, mesmo em 1982. Me lembro de quando  meu professor de judô me chamava para falar para seus amigos  os nomes das bandas que eu conhecia - nunca entendia porque ficavam espantados com aquilo.
Mais à frente o repertório em casa se transformou em Música Brasileira. Gil, Caetano, o Clube da Esquina, o pessoal do Nordeste. BRock, Chico Buarque, os nomes da Bossa Nova e muitas outras coisas eu viria a descobrir e digerir sozinho bem mais tarde.
Um dos componentes desse amálgama foi o "Mais Podres Do Que Nunca", dos Garotos Podres. O primeiro disco de música punk brasileira a que tive acesso. No início soava meio como uma brincadeira embalada pela faixa "Vou fazer cocô", que hoje em dia acho que resume - como pouca coisa - a relação entre os espectadores do "espetáculo" da política brasileira - se soubéssemos que 26 anos depois um palhaço semianalfabeto seria o deputado mais votado do país, não acharíamos graça (ou acharíamos?).

Para aqueles que estão acostumados com muita liberdade, logo na capa líamos: 

Músicas "JOHNNY" e VOU FAZER COCÔ"
Autorizada a Execução em Recintos Fechados.
Proibida a Execução em Rádios e TVs.


O punk brasileiro teve um grande - quase totalidade - número de bandas de São Paulo ou ABC paulista. Ratos de Porão, Olho Seco, Inocentes, Cólera... aliás esta última fez um show antológico com Tubarões Voadores no Circo Voador em 1990 em que praticamente toda a casa em um certo momento saiu na porrada, com gente esfaqueada, prisões... eu estava lá.

"Pela Paz" - Cólera

Me lembro, mais tarde, de um colega de 14 anos cantando quase todas as músicas do disco comigo. Por algum motivo houve repercussão do álbum entre jovens de classe média carioca.
O verbete sobre este disco na Wikipédia é muito pequeno e sensacional, com tudo o que já iria escrever aqui, então vocês podem dar uma chegada lá e me poupar o esforço. Se quiserem, podem dar uma apreciada em outra canção. Separei "Miseráveis ovelhas" - desculpe, mas minha visão de musicólogo me obriga a pedir que atentem para o coro da banda (ovelhas?) e para  a gaita mais punk que já ouvi na vida.




quarta-feira, 18 de julho de 2012

Sigam-me os fiéis (os infiéis também)! Música e Religião. Acredite!


Música e Religião sempre estiveram profundamente ligadas. Não conheço uma manifestação religiosa que não se utilize de tal linguagem. Inclusive, embora a Música que conheçamos hoje esteja fortemente ligada ao entretenimento, nem sempre foi assim. 
Exércitos sempre foram impelidos por caixas e trombetas, assim como descrito em Josué 6, quando após se fazerem soar sete vezes, as trombetas fizeram ruir as então inexpugnáveis muralhas de Jericó (o exército israelense invadiu "e tudo quanto havia na cidade destruíram totalmente ao fio da espada, desde o homem até à mulher, desde o menino até ao velho, e até ao boi e gado miúdo, e ao jumento". Menos a prostituta Raabe, mas isso já é outra história), significando para mim o grande poder da Música de romper todas as barreiras ideológicas e preconceitos. Música é arma.

Fico imaginando o homem europeu medieval. Imundo, analfabeto, no ambiente nas catedrais góticas, com sua arquitetura e seus vitrais criando um ambiente impressionante e místico para a época (continua a ser para aquele que se permite) ouvindo corais de missas cantadas em polifonias ainda adolescentes. De vozes infantis. De homens castrados. Sentindo-se tão perto de seu deus. 

Organum Duplum de Leonin, um dos compositores da escola de Notre Dame (sim, a catedral parisiense era uma escola), junto com seu irmão gêmeo Perotin.

Tudo seria "reformado" - via Música - com os corais luteranos tão comprometidos com sua mensagem e tão bonitos. Se João Sebastião Bach (in Bach we trust!) era profundamente impulsionado e influenciado por essa força, quem poderá menosprezá-la? Será que essa importância dada à Música por protestantes terá gerado a grande quantidade de centros onde se aprende a tocar instrumentos de igrejas pentecostais e neopentecostais?

Cantata 147 de J.S. Bach - "Jesus bleibet meine Freude" ("Jesus, alegria dos homens")

Ainda dentro do espectro judaico-cristão me remeto à fala ekfonética. Rituais de linda monodia - uma fala insatisfeita, querendo alçar voos.
Budistas cantam. Monges entoam longas vogais, poderosas, geram transes (cuidado com a levitação). Nossos índios buscavam a pulsação, eram (são) rítmicos, ostináticos, eternos móveis dentro de uma floresta gigantesca. E a dança da chuva feita num desenho animado do Pica-Pau numa televisão à tarde.
Canto de monges budistas - quem arrisca um remix?

Da mesma floresta vem a ayahuasca, que junto com a Santa Maria (conhecem? Viver num país com liberdade religiosa possibilita cada coisa...) impulsionam os hinos do Santo Daime (por onde andará Andréia, que me procurou justamente para estudar isso?) 
Hino "Eu tomo Daime". Não sei quanto a vocês, mas eu ouço todo o sentimentalismo brasileiro..

Aliás, Daime é  religião brasileira como a Umbanda. É tudo obscuro, mutável, mas incrivelmente influente em nossa cultura. Toque de exu, de caboclo, de pomba-gira etc etc etc... tamborzão.
Ponto de Umbanda - "Cigana de fé". Quem conhece os discos de samba ("Sou fio da véia, ô... eu não temo nada... a véia tem força, ô... na incruziada...")? Semelhanças?

Sinto saudade dos Hare Krishna que andavam cantando, tocando e dançando pelas ruas da cidade. O que terá acontecido? Trocaria fácil suas músicas por muito do que ocupa a paisagem sonora atual. Um toque de recolher?
Belo canto responsorial. Verdadeiro processo de musicalização infantil informal.

Espero não ser mal compreendido por ninguém - não ter que enfrentar fúrias e jyhads. Afinal de contas, todos estaremos juntos quando as sete trombetas evocarem os sete anjos do Apocalipse. Canta pra subir!




sexta-feira, 13 de julho de 2012

Dia do Rock! Vamos à Galeria Rock do Rio!


Comecei a comprar discos com 11 anos - de vinil, para deixar claro. Hoje em dia compro ainda mais. Me lembro muito bem que conseguia comprar um LP economizando o dinheiro de um ou dois lanches na escola. Outros tempos.
"Lojas de disco são coisas que não existem mais. Adolescentes já ouviram falar que existiu mas não fazem ideia real do que tenham sido". Hmmm... não é bem assim. As lojas de discos continuam a existir e nunca desapareceram completamente. Para falar a verdade, são dos poucos lugares interessantes e que realmente gosto de frequentar na cidade. Possuem alma, autenticidade e sobretudo conteúdo, muito conteúdo.

Eram muitas as lojas de discos. No subsolo da galeria Vitrine da Tijuca estava a SubSom, que costumava ter um dos melhores acervos da cidade - foi lá que comprei o "Let's Start a War" do Exploited importado e o "Uplift Mofo Party Plan" do Red Hot Chili Peppers numa época em que o nome dessa banda era absolutamente desconhecido no Brasil. Tal galeria - chamada timidamente por alguns de "galeria do Rock" (a timidez é certamente alimentada pela diferença da homônima de São Paulo) - ainda está lá. Possui três lojas de discos e outros comércios interessantes. 


SUBSOLO



No subsolo não existe mais a SubSom, mas a visita vale por dois estabelecimentos de perfis diametralmente opostos: um o Antiquário Fernando França que leva o nome do dono, com peças interessantíssimas; outro a Montana Shop, uma loja de graffiti (sim! Uma loja de graffiti!) com a Alba sempre muito simpática. Há também uma sex shop, mas a dona não gostou de me ver fotografando a fachada, foi antipática e achei a vitrine cafona.


Será que já foi usada para o diz ter sido feita?


"A Cavalgada das Valquírias". Conferi e está correta.



































TÉRREO

No piso térreo destaco a Banzai Tattoo & Piercing, loja matriz desse que é um dos maiores estúdios de tatugens e piercings do Brasil, com lojas em Ipanema e na Barra. Atualmente a série Rio Ink (versão carioca de Los Angeles Ink) está sendo filmada na filial Ipanema.
Banzai



LOJAS DE DISCOS:

No segundo piso estão as lojas de discos. Damos de cara com a Darkland em frente à escada rolante. Muito disco de vinil, CDs, camisetas e outros acessórios. Rolava "The battle of Epping forest", do Genesis quando cheguei (para os meus alunos: raro exemplo de canção com compasso setenário). Comprei um DVD do Motorhead baratinho, R$25,00.
                                                                                            "The battle of Epping forest" - Genesis
Darklands




Bem em frente temos a Sheherazade, que iniciou especializada em rock progressivo, mas atualmente também trabalha com outros estilos. Não à toa soava "I don't want to talk about it" do Rod Stewart. Mas o dono, muito simpático sabia tudo sobre Prog. Resultado: mais um DVD do AC/DC lá em casa. Passatempo da minha viagem, alegria das minhas crianças.


Gostei muito dos relógios de parede com motivos remetendo a logotipos de bandas e capas de discos. Quando forem me dar de presente, quero o da capa do "Aqualung".
Relógios de parede



Sheherazade




Logo ao lado está a Headbanger, a maior das três lojas, também com um bom acervo e grande diversidade de camisetas e acessórios muito interessantes. Acabei perdendo a linha e comprando camisetas pra família toda e uma de presente pro meu sobrinho. O pessoal ouvia um disco do Dream Theater com covers de rock clássico. Me lembro bem de "Machine Messiah" do Yes.






Headbanger








Headbanger - take do interior



Fiquem à vontade para me presentear também com essa coleção do Miles Davis.

TERCEIRO ANDAR

No terceiro andar estão a Banzai Tattoo (a loja só de tatuagens, a de piercing fica no térreo), sempre muito bonita. Lá também se encontra um dos poucos grandes alfaiates da cidade, o Tony. Me lembro que quando criança frequentava a alfaiataria com meu pai, que lá fazia seus ternos. Fico devendo uma foto da loja, mas pode ir que ela está lá.




Fiquei um pouco triste de ver algumas lojas fechadas, mas também confesso que isso dá um ar meio underground ao espaço. Um movimento de união entre as lojas certamente daria um gás ao lugar e traria de volta a garotada à galeria. Se precisarem de mim, estou na área!

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Mini-biografia de adolescência e seu ambiente musical.


Me lembro dos meus primeiros rasgos de rock'n roller : aos 11 anos comecei a me interessar pela madrugada. E era um interesse real e honesto, afinal não existia TV 24 horas (meu deus, a cada post fico mais velho...). Era o moleque fritando na cama até as 4 da madruga. Resultado: no dia seguinte um zumbi a mais em meio a massa de alunos do Marista.
Começava nesse momento a onda BRock - RPM, Legião Urbana, Capital Inicial, Ultraje a Rigor e um monte de outras coisas que eu (e todo mundo) ouvia sem parar.
Encurtando: repetência da 5a. série. Não por causa das bandas, é claro.

RPM - "Alvorada Voraz" no programa Chico & Caetano (cara do Chico, bigodinho do Caetano, mullet do Paulo Ricardo)


5a. série refeita. No ano seguinte a madrugada já deixara de ser uma novidade. Era parte de mim. E, pelo jeito não era muito compatível com a rotina. Suspensões, atrasos, deveres de casa nunca feitos, notas baixas, brigas.
Repetência da 6a. série, dessa vez acompanhada de um elegante convite a não renovar minha matrícula na escola. O BRock ainda era absolutamente soberano.
No MV1 tive direito à dependência em Matemática. Provavelmente a coisa mais fácil que fiz em toda a minha vida. O perfil da nova instituição, o incremento de mais um ano de vida e umas amizades que fiz desandaram a coisa. Agora havia novos elementos: Rua + Noite = coisas e outras coisas que atrapalharam mais ainda a vida acadêmica.
Impedimento de renovar minha matrícula e a peregrinação por escolas muito fracas. Eu agora me interessava  por música mais pesada.

                                                                                                    Deep Purple - "Black Night"

Daí pra frente foram escolas só para constar. Hoje em dia imagino como nelas estavam basicamente a galera que também não tinha "funcionado" nas instituições tradicionais. E juntar todas essas pessoas no mesmo lugar não podia dar em boa coisa. Ensaiei um abandono dos estudos e a crise (que eu nem sabia que existia) se aprofundava. Era um vagabundo de verdade.


The Exploited - "Chaos is my life"

Minha sorte foi que (calma, não entrei para igreja alguma) comecei a ver meus amigos e conhecidos antigos entrando em faculdades e dirigindo carros, o que me fez acordar para o que estava acontecendo. Coisa parecida viria a me acontecer uns 10 anos depois quando, tocando em "buracos" na noite parei para olhar para a cara de alguns colegas que faziam aquilo a trinta anos.
Joga tudo pro alto e recomeça. Reconheço que tive sorte de poder me "refazer" àquelas alturas. Virei um aluno padrão regenerado (putz, que definição ridícula). Só faço questão de requerer para mim o mérito de ter tido aquilo que chamam por aí de "humildade" - reconheci as opções erradas que vinha fazendo e mudei. Nunca mais tive medo de fazê-lo. Não posso querer resultados diferentes mantendo atitudes iguais.
Muita música ainda viria pela frente.


Milton Nascimento e Lô Borges - "Tudo que você podia ser"

sábado, 30 de junho de 2012

Tijuca. À procura da trilha perdida.

Rugendas: "Viajantes para a Tijuca seguindo uma tropa de mercadores." (1820)


Escrever o post "O outono no Rio", adornado pela canção homônima, me levou  a reencontrar o CD "As segundas intenções do manual prático", de Ed Motta, e consequentemente "A Tijuca em cinemascope" - lindo tema cheio de climas meio cinematográficos. Sou tijucano. Sou de um tempo em que se decidia ir ao cinema a qualquer momento entre meio dia e 9 da noite com a certeza absoluta de que iria achar pelo menos umas 3 opções a 5 minutos de casa. A pé.
Da rua Uruguai à do Matoso: Cine Coper, Cinema Tijuca (que depois se dividiu em duas salas), Art Palácio, Bruni, Carioca, América, Tijuca Palace (que também viria a se dividir em 1 e 2) e Comodoro. E antes de minha adolescência existiam outros.
Acho que o Coper não virou nada, simplesmente fechou; o Tijuca virou Casa&Vídeo; Art se transformou em Leader Magazine; Bruni em laboratório; Carioca virou uma Universal e o América uma drogaria Pacheco; Comodoro outra Universal. Não basta destruir, tem que denegrir e jogar cal em cima.










Os espaços que possuíam música também já se foram. Pouca coisa ficou. Mas não sei se é o excesso de otimismo, saudosismo ou outros ismos quando sinto no ar a possibilidade de um renascimento cultural do bairro. Penso no desperdício de um lugar com tanta tradição no Rio de Janeiro ter tão poucos espaços para apreciar música, especialmente porque aqui há público com bom poder aquisitivo. Mas eles existem. A seguir dois que vez por outra frequento:
1 - Otto - Fui pela primeira vez com minha garota para comer a costela (acho melhor que a do Outback) e apreciar a excelente carta de cachaças da casa. Meu único senão era justamente a música ao vivo. Não suporto bar com música ao vivo. E eis que tomo um tapa na cara com o trio de jazz que tocava naquela noite. Davam banho. Banho! Num volume agradável. E olha que não sou de elogiar à toa. O sucesso dessa casa é prova de que um investimento bem feito no bairro dá resultado.
2 - Calabouço Heavy & Rock Bar - Na Felipe Camarão, com espaço pequeno, mas interessante. Rock'n Roll e adjacências. Ambiente underground, mas organizado. Verifique quem vai tocar antes. Beba e grite. Abaixo o vídeo da banda Dio Years na casa.








sexta-feira, 29 de junho de 2012

Saravá Metal! Licença!

Me lembro do meu primeiro dia de aula na disciplina "Folclore Musical Brasileiro". Unirio, 1996 (meu deus! Século passado - idoso). Iniciou-se com uma pergunta: "Se vocês fossem donos de uma loja de discos, em que categorias disponibilizariam seus produtos?". Começam a pipocar as respostas: "pop", "clássico", "rock" etc, até que alguém diz: "sacra, música religiosa". E a professora: "Sacra? Como assim? Música de umbanda, por exemplo... né?" O mal estar simbolizado por nosso silêncio cuspiu o preconceito no chão de mármore limpinho (metafórico, hein?! Por favor...). E gerou reflexão. 
A umbanda é uma religião genuinamente brasileira, que brotou de nossa terra assim como o samba ou o jeitinho. Sempre me sinto um pouco ferido em minha alma democrática, libertária e ufanista quando ouço menções pejorativas a ela. Não gosto de intolerância em geral. 
A banda carioca Gangrena Gasosa faz música que mistura elementos da macumba, death metal, humor... e sofre o preconceito também. Me recordo que a primeira vez em que ouvi falar deles foi através das páginas dos jornais - haviam sido agredidos por pessoas que se julgavam ofendidas religiosamente. O mais curioso é que não se sabia se os responsáveis eram cristãos ou umbandistas.
Certa feita, chegando na Casa de Música de Ipanema, encontro um ambiente com pessoas cantando - ou tentando cantar - "A Supervia deseja a todos uma boa viagem". Coisa que não se ouve toda hora, aquilo me despertou minha curiosidade.

Gangrena Gasosa
Abaixo segue o link para a canção "Surf Iemanjá", do disco "Smells like tenda spirita" - puro antropofagismo.
PS1: Uma boa parte de vocês não sabe o que é uma loja de discos - muitos nem uma loja de CDs -, mas elas ainda resistem por aí (como as da  galeria Vitrine da Tijuca ou a Baratos da Ribeiro em Copa, por exemplo). 
PS2: Gostaria de dedicar esse post à professora Elizabeth Travassos, que viria a ser minha orientadora de mestrado, quando estudamos o funk proibidão carioca. Atualmente ela não pode lê-lo por problemas de saúde, mas gostaria de fazer essa referência devido à grande influência que ela teve em minha maneira de ver as coisas (professores... sempre eles).





quarta-feira, 27 de junho de 2012

O Centro: A Igreja de Nossa Senhora Mãe dos Homens

Amo o Centro da cidade. Desde criança tinha fascínio por aquele lugar que é de todos e ao mesmo tempo não é de ninguém. Mas o mais interessante é a como essa parte da cidade tem o poder de manter sua imponência: arquitetura, economia, política, cultura, comércio... bem no meio (?) da urbe. Foi o Brasil por muito tempo (o quanto ainda é?). Palco de muito e de tudo.
Em uma andança, tive a sorte de passar bem em frente à Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens. Aquela entrada pequena guarda um santuário neoclássico - em geral ninguém esquece a primeira vez que vê (assim como nunca me esquecerei da primeira vez que entrei no Maracanã, especialmente o som que invade os ouvidos, mas isso é uma outra história). Dizem que serviu de esconderijo para Tiradentes em fuga. Tive a sorte de passar por lá numa terça-feira de maio, pela hora do almoço, e encontrar perto do altar um violonista e um flautista tocando dentro da nave vazia. Puro lirismo que aguardava por mim. Saibam eles que entrou ali a pessoa que vai carregar o momento para sempre.




Para vocês uma Ave Maria menos conhecida que a de Gounod ou a de Schubert - a de Caccini, que viveu um pouco depois do achamento do Brasil.



terça-feira, 26 de junho de 2012

Muzak.

Muzak. Pouca gente conhece, mas trata-se de um produto muito lucrativo. Veiculação de música para ambientes que precisem de controle. Elevadores são um exemplo muito comum.
O ambiente musical pode surpreender radicalmente. Partimos do princípio - muitas vezes inconscientemente - que em lojas, shopping centers, restaurantes e outros espaços de interação, a música é parte da decoração, mero preenchimento do silêncio. 
Eis que estava eu numa loja de roupas entretido com escolhas quando de repente põe-se a soar uma canção - em inglês, é verdade - com palavras de fazer corar Bukowski (exagero). Irrompi com uma risada, prontamente repreendida pelos olhares ao redor ("Está rindo de quê?"). Arrisquei desbravar a situação: "Você ouviu a letra da canção?" "Não, senhor. Não estava prestando atenção." - respondeu o vendedor que dançava contidamente.
Descobri mais tarde que o cantor era o amável papai abaixo. E a canção vai em seguida. Julgue se estou velho ou se minha surpresa é fundada. Eu disse fundada.



Música para livros

Passeio por Ipanema mais uma vez atento à música no ar. Não me atrevo a definir a paisagem sonora como Música - muitas pessoas, entre elas meus alunos, costumam se indignar com isso. E assim me lembro das obras de pessoas como Pierre Henry e John Cage, com seus instrumentos: rádios, pianos preparados e objetos cotidianos; o acaso e a aleatoriedade fazendo parte do resultado sonoro, sem falar no silêncio. Procuro um ambiente menos comum e entro na livraria Galileu certo de que os livros serão bons companheiros de audiência.
Ao fundo uma canção estilo charm (charme?), uma cantora que não consigo identificar, um som sereno, sem mudanças - cara de paisagem.  Ao fim a resposta: Sulamérica FM. Muita propaganda depois, segue uma canção que poderia ser continuidade da anterior, mudando a intérprete.
E os livros? Estarão dormindo? Calmos... ou quem sabe de saco cheio?
Um pouco de Cage, pra vocês se indignarem. Ouçam com atenção!


domingo, 24 de junho de 2012

Ainda mais outros outonos


Dessa vez interpretado por uma voz que dispensa imaginarmos as tais folhas que caem. Mais sutil do que o silêncio.





      "Chesney (Chet) Baker nasceu em Oklahoma e foi criado em um subúrbio de Los Angeles, Califórnia. De seu pai, guitarrista amador de bandas de country, além de herdar o nome herdou também o amor pela música; foi ele quem lhe deu um trompete quando fez treze anos, para que pudesse entrar para a banda do colégio. No entanto não era muito dado a estudar música. Costumava dizer que sempre se safou por ter excelente ouvido. (...)
      Chet Baker foi o músico cool por excelência, não só musicalmente, sendo um dos pais daquele estilo, como também na atitude de calculada indolência, que se tornou famosa. O jeito "cool", porém, escondia na realidade um temperamento esquentado. A devastadora dependência de drogas fez com que durante décadas Chet se visse num labirinto infernal de crises pessoais, contratos interrompidos, brigas, internações e prisões. Sua aparência sofreu ao longo da vida uma transformação impressionante, devido ao uso de heroína e suas consequências. (...) 
      Chet também gostava de cantar, com uma voz pequena e frágil que às vezes evoca Billie Holiday."

V.A Bezerra (2001), disponível no site EJazz  <http://www.ejazz.com.br/detalhes-artistas.asp?cd=113>

Mais outros outonos

                 
Será a voz sutil que expressa esse outono um reflexo de sua vida pessoal? 


           

    "Havia dois motivos que levavam Billie à polícia: durante a infância o sexo tinha papel primordial, enquanto na idade adulta seu envolvimento com as drogas prevalecia. Desde os quatorze anos começou a fazer uso de maconha e bebidas alcoólicas. Aos vinte e seis anos, por ocasião de seu primeiro casamento, passou a fazer uso de ópio  e um ano depois de heroína. Quando seu corpo já se encontrava inteiramente perfurado por agulhas, Billie injetava a droga em sua própria vagina. 



            Para Billie a droga a encorajava para “enfrentar” o palco. Além disso, tinha o hábito de ser 'surrada' por seus companheiros para garantir um bom recital. Billie casou-se quatro vezes. Construía relações demasiadamente destrutivas, pois os homens elegidos por ela obedeciam, sucessivamente, ao mesmo estereótipo: 'trapaceiros, hostis, desleais, agressivos'. "
Julie Travassos. "Billie Holiday: um corpo a serviço do gozo." 
Interessantíssimo e pequeno artigo disponível em

sábado, 23 de junho de 2012

Outros outonos

Contrapeso: o outono europeu também reverbera como o nosso? E em nós?
"As quatro estações: outono" - Antonio Vivaldi


O outono no Rio

Dando continuidade à série "outono: estação mais da alma que da natureza". Ouvi essa canção pela primeira vez numa época em que Miles, Brubeck e Baker era só o que me soava - o Be-bop pesado já tinha ficado para trás. E o verão também.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Outono

Estamos em junho. "Repara que o outono é mais estação da alma do que da natureza" - Drummond ou Nietzsche?
Responde, Alceu!



Lidador. O Rio. Cachaça e Bunda de Fora.

Andando por Ipanema na hora do almoço, fiz de tudo para encontrar um ambiente musical simples, com feijão e arroz, com carne de panela, farofa (duvido misturar com macarrão). E música.
Acabei por parar ali no "Bunda de Fora" (conhece? Na Vinícius entre a Barão da Torre e a Nascimento Silva). O som de fundo era televisão - baixinha, é verdade -, mas o interessante papo de frequentadores de boteco, que me esforçava ao máximo para captar, resolveu. Era um torcedor do Ceará querendo confrontar um senhor flamenguista. Num dialeto muito louco.
Na saída dei uma passadinha na Lidador para um rápida olhada na vitrine que, por causa da Rio+20, tem o tema Cachaça. Na porta, enquanto observava uma promoção da "Seleta" (R$14,90 - vale a pena!) um trio regional desaguava chorinhos - e tenho certeza que o pandeirista fazia parte do quarteto que tocou no meu casamento -, me brindando com um "Doce de Coco" do Jacob do Bandolim. Sobremesa justa e gratuita.